Setor elétrico teria R$ 64 bi em custos não repassados, diz consultoria
30.04.2015
O susto do aumento de 40%, em média, das tarifas de energia no primeiro trimestre mal passou e o consumidor poderá enfrentar um novo "tarifaço" pela frente. Segundo levantamento feito pela consultoria PSR, há um passivo existente no setor elétrico de cerca de R$ 64 bilhões, fruto principalmente da crise de energia, ainda a ser pago. De acordo com relatório da consultoria distribuído ontem a clientes, esse custo adicional é relativo a eventos do setor cujo impacto ainda não foi reconhecido pela Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel). Além disso, a maior parte desse montante ainda não teve a sua alocação definida, ou seja, se será pago pelo Tesouro ou diretamente nas contas de luz, via repasse tarifário. Com o ajuste fiscal em curso pelo governo, a tendência é que os consumidores arquem com a maior parte dessa fatura. Tudo indica, porém, que o repasse será parcelado em vários anos. Se todos esses custos fossem incorporados de uma só vez à tarifa de energia em 2015, já considerando a bomba tarifária de 40% nos primeiros três meses do ano, haveria um reajuste adicional de 33% na conta de luz dos brasileiros. A maior parte dos custos extras analisados pela PSR ainda é relacionada à polêmica Medida Provisória 579/2012, da renovação das concessões. Dos R$ 63,8 bilhões calculados pela consultoria, R$ 27,6 bilhões são referentes a indenizações de ativos de transmissão e geração. Sobre os ativos, de transmissão anteriores a 2000, e cuja concessão foi renovada no âmbito da MP 579/2012, o total de indenização ainda a ser paga soma R$ 17,9 bilhões, de acordo com laudos contratados pelas transmissoras. No caso da geração, há concessões de Cesp, Cemig e Copei que vencem em julho deste ano! Além disso, há um pleito de indenização extra feito pelas subsidiárias da Eletrobras. Considerando os laudos já apresentados por Cesp, Cemig e Chesf, o valor é de R$ 9,7 bilhões. Ainda não foram apresentados os pedidos de indenização de Furnas, Eletronorte e Copel. Mesmo que a Aneel reconheça um valor diferente daquele pleiteado pelas geradoras e transmissoras, possivelmente uma cifra menor, o montante terá que ser bancado pelo governo ou diretamente pelo consumidor. "Não sabemos como isso será pago, se o governo vai tirar dinheiro do Tesouro ou se será via repasse tarifário", disse Priscila Lino, diretora da PSR. "Uma hipótese é que, dado que o governo colocou as indenizações já acertadas dentro da CDE [conta de desenvolvimento energético, encargo do setor repassado à tarifa de energia], é capaz de esses gastos virem a aparecer como aumento da CDE nos anos seguintes." Outro custo adicional calculado pela consultoria vem da insuficiência de recursos recolhidos do sistema de bandeiras tarifárias, que entrou em vigor neste ano. Nas contas da PSR, haverá um déficit de R$ 4,8 bilhões entre os custos variáveis das distribuidoras e os recursos aportados via bandeira tarifária para o período de março a dezembro. Considerando que em janeiro e fevereiro o valor não compensado pelo recolhimento das bandeiras foi de R$ 1,3 bilhão, o total ainda a ser repassado ao consumidor relativo a 2015 chega a R$ 6,1 bilhões. A cifra deverá ser reconhecida nos reajustes tarifários. O Instituto Acende Brasil, centro de estudos do setor elétrico, também avalia que o valor reservado para as bandeiras tarifárias não será suficiente para cobrir as despesas com a geração térmica necessária para garantir o abastecimento elétrico nacional este ano. "Louve-se o grande esforço feito pelo governo para implementar o realismo tarifário, mas ainda há um longo caminho a percorrer" disse Cláudio Sales, presidente da entidade. Os dados da PSR incluem também o impacto da renegociação da dívida da Eletrobras com a Pe-trobras relativa aos custos de combustível para geração de energia nos sistemas isolados, principalmente na região Norte. Na ocasião, ficou acertado o pagamento de dívida de R$ 8,1 bilhões em dez anos, via CDE. Apenas uma parte desse valor foi incluída na CDE deste ano. O restante será aplicado no encargo cobrado nos anos seguintes. Outra parcela bilionária dos custos extras do setor se deve ao déficit de geração hídrica. Em 2014, o prejuízo das geradoras hidrelétricas com o GSF [sigla em inglês para a medida da geração das usinas] foi de R$ 20 bilhões. A previsão para este ano é de uma perda ainda maior. Considerando o pleito das geradoras para que o governo "amorteça" parte desse impacto, já que uma parcela do déficit se deve à decisão extraordinária do Comitê de Monitoramento do Setor Elétrico (CMSE) de manter as térmicas ligadas, a PSR calculou o efeito de um auxílio ao segmento da ordem de R$ 10,5 bilhões. Por fim, a consultoria fez uma do custo do plano de ação adotado pelo governo para garantir o suprimento de energia e descartar um racionamento este ano. Considerando três medidas (a importação de energia de Argentina e Uruguai; a manutenção da operação do parque termelétrico de Manaus e a contratação de energia de geradores a óleo combustível e diesel de grandes consumidores no horário de pico), o impacto seria da ordem de R$ 11,5 bilhões. Com relação à contratação de energia de geradores a óleo, diesel e biomassa, cálculo feito pela comercializadora Safira Energia, a partir de volume de mil megawatts (MW) médios dessas fontes, indicou custo extra de R$ 702,6 milhões por mês. Considerando o período de maio a dezembro de 2015, o impacto na tarifa de energia seria da ordem de 5,06%. O Ministério de Minas e Energia disse desconhecer o estudo da PSR. Sobre o pleito das geradoras hidrelétricas, o ministério informou, em nota, que "aguarda avaliações que estão sendo feitas pela Aneel".
Autor: Valor Econômico